A minha incursão pela experiência do Futebol de Formação foi uma opção pensada e desejada há muito e baseada no reconhecimento e gratidão, registada desde o tempo dos meus 16 anos enquanto jogador júnior (escalão de estreia na minha formação como jogador de futebol), pelo trabalho dos treinadores e de todas as pessoas envolvidas no apoio e colaboração neste escalão do meu clube de formação, o Atlético Clube da Malveira, e nesse sentido sempre achei que um dia devia também dar o meu contributo aos jovens, como me deram a mim.

ÉPOCA 1986/1987 ACM
Na primeira época de sénior e logo uma subida!

Paralelamente e já como Treinador de equipas seniores acompanhei sempre de perto, com atenção e curiosidade, alguns trabalhos na formação de clubes, e como tantos de nós, ainda mais de perto, o desenvolvimento desportivo de formação dos meus filhos que me “obrigavam”, ás vezes até em horários impróprios para alguns escalões, a acompanhar treinos e jogos onde participavam.

PARTICIPAR, parece-me ser, a palavra mais correta e o mote, para o desenvolvimento da minha ideia de formação e para esta a minha pequena colaboração com esta página, que será baseado na experiência adquirida, primeiro como jogador, e depois como Treinador de equipas seniores, que um dia entendeu que estava na hora de recusar convites de equipas dos “grandes” e executar a ideia de ser tempo de “dar” e transmitir  um pouco daquilo que me ensinaram a mim, daquilo que me deram enquanto jogador e treinador, mas essencialmente como pessoa, e devolver e partilhar como missão, todos os ensinamentos, toda a disponibilidade, todos os bons princípios e valores que felizmente a grande maioria dos agentes desportivos que tive o prazer de conhecer me passaram e que sempre registei com atenção.

Quando falamos de formação, temos que saber em que realidade estamos, em que clube trabalhamos, qual a dimensão e o propósito a aplicar na verdadeira importância de tudo o que fazemos, porque estamos a lidar, para todos efeitos, com crianças!

Há muitos (Treinadores, Diretores, Pais…)que confundem os exemplos dos grandes clubes nacionais e mundiais, onde a missão, o grau de exigência, o profissionalismo e o fator financeiro é determinante (talvez erradamente…) na construção competitiva de uma carreira de um jovem com aquilo que deve ser aplicável na arrebatadora maioria dos clubes de menor dimensão e dos distritais, onde alguns , às vezes até de forma caricata, “embelezam” a formação com nomes de “Academias” “Escolas de Formação” “Escolas especifica de Guarda-Redes” etc…

É, pois, este enorme segmento de jovens que vivem em cada zona geográfica fora dos grandes centros e longe dos grandes clubes, que me despertou a vontade de colaborar e no meu caso particular, a simples experiência foi na minha área de residência com 4 anos de treino de formação da equipa júnior do Clube Desportivo da Venda do Pinheiro, que por incrível que pareça não tinha, aquando a criação deste projeto, equipa júnior, numa localidade que tem cerca de 10.000 habitantes!

O ideal concebido e transmitido ao Presidente do clube foi o de reunir jovens, independentemente da sua qualidade, para formar uma equipa minimamente competitiva e que pudesse dar a estes jovens a possibilidade de participarem, de se sentirem incluídos, de se sentirem “jogadores” de se sentirem parte de um grupo, importantíssimo nestas idades “perigosas” de todas as perguntas, indefinições e curiosidades próprias de quem está a tornar-se homem e o Futebol , meus amigos, é uma escola fantástica de grandes princípios, regras e boa experiência para a vida e que infelizmente nem toda a sociedade e as entidades publicas se apercebem e colaboram da melhor forma; e cada vez mais os clubes necessitam que alguém demonstre a importância do que falo!

Vai longe o futebol de rua (que pena…), onde a alegria, a vivacidade e a presença assídua de muitos jovens era evidente e desenvolvia uma sociabilidade salutar entre todos; nos tempos modernos e recuperando a ideia que falei atrás , o excesso de zelo e copia errada dos modelos mais profissionais de formação para estes exemplos geográficos, adicionando a interação de alguns Pais que “exigem” e comprometem o espírito e a alma dos filhos no desenvolvimento natural do seu crescimento enquanto atleta, afastam e fazem desistir muitas vezes os jovens atletas.

Nesta minha experiência e em quatro anos, nunca dispensei um jogador, o que também é elucidativo e preocupante relativamente à quantidade de atletas que aparecem nas captações, mas essencialmente, a não dispensa passa pelo ideal de proporcionar aos atletas interessados e focados, respeitando, claro está, os princípios básicos elementares do futebol, e independente da sua qualidade técnica e física, a possibilidade de participarem desportivamente num clube.

Incrivelmente há clubes nas ultimas divisões de formação que almejam “roubar” jogadores a terras próximas e não próximas, criando meios e formas de transporte, para ir buscar “os melhores”, cegando com o objetivo apenas de ganhar e esquecendo-se que a sua missão é também inserir os jovens das suas localidades, mas invariavelmente os resultados e a consciência acrescentaria eu, nem sempre são os melhores…

Não pensem que esta escolha e ideal abdica da competição e de ganhar, nada disso, na minha ideia o grande desafio do Treinador de formação (não será de todos?), é descobrir os talentos mais escondidos, potenciar os mais limitados, equilibrar e fazer com que se distribuam as qualidades dos mais predestinados pelos os outros.

Para se colocarem só os “melhores” “à vista desarmada”, não será preciso Treinador…basta ir à bancada e pedir a opinião de um entendido, há muitos!

Assisti, como observador de jogos de formação a coisas incríveis como por exemplo, nos escalões mais baixos e onde as várias substituições são possíveis, jogar-se sempre, ou quase sempre com os “mais capazes” e depois de o resultado estar só garantido com goleada, colocar a jogar “os menos capazes”, todos ao mesmo tempo, 2,3 ou 4 minutos…!

Que evolução, que melhoras podemos esperar quando os “menos bons” jogam só uns com os outros e não “misturados” com os “bons”?

Há grandes surpresas na evolução de alguns jovens e aqueles que às vezes parecem ter mais potencial não são aqueles que vão chegar a sénior e outros mais limitados, com a devida oportunidade e atenção, poderão ter um desenvolvimento crucial e de futuro, por isso, há que trabalhar na distribuição de oportunidade equitativa para todos e principalmente fazer todos sentirem-se incluídos e que “contamos com eles”, porque se isso com adultos é essencial, para com crianças devemos ter comportamento obrigatório para este propósito.

A base deste discurso e ideal de formação pode parecer pouco ambicioso, competitivamente falando, mas os resultados deste trabalho, foram na minha opinião, muito positivos, com bons resultados desportivos com a subida de escalão ao terceiro ano e manutenção no escalão superior (1ª Divisão Distrital de Júnior) no quarto ano, mas essencialmente a consciência plena de tudo ter feito (nem sempre é possível agradar a todos) para os jovens se sentirem a participar num objetivo comum e que cada um à sua maneira se sentiram uteis e incluídos num grupo de recordação para a vida.

Um senão nesta experiência que vos transmito e que seria perfeita; a não possibilidade, por motivos de disponibilidade profissional, dar continuidade a este projeto, com a formação de uma equipa sénior, atualmente inexistente no clube, de forma a dar a merecida sequencia e oportunidade à grande maioria destes jovens atletas que mostraram capacidades para este desafio.

Espero que este artigo “real” vos tenha sido útil e interessante de ler.

Obrigado e Parabéns a todos que se tem dedicado ao Futebol de Formação!

2 Comentários

  1. Miguel Ferreira
    19 Julho, 2018
    Responder

    Adorei o artigo, gostava muito de conversar com este senhor sobre futebol… Gostava de encontrar alguém que conseguisse perceber que atletas são realmente capazes… E não aqueles que se encontram por aí que analisam o jogador de uma forma muito leviana e com um desconhecimento enorme do que deve ser um jogador de futebol… E são treinadores, com cursos!!!

  2. Thiago Leal
    9 Fevereiro, 2020
    Responder

    São por pessoas assim como você que o futebol respira! Nós treinadores temos a obrigação de formar, ensinar muito mais que futebol, sem deixar de ensinar futebol…

    Este sentimento de pertencer ao clube da sua localidade de fazer parte de algo que o transcenda enquanto indivíduo. É multiplicado às gerações futuras e é assim que um clube se torna querido e admirado naquela localidade. Cumprindo a sua missão de formador para a vida, de ensinar valores e mostrar sentimentos que serão sentidos para sempre!

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