Idade relativa vs Idade Cronológica

Todos nós já ouvimos alguém dizer: “Eu sou mais velho do que tu”. Na realidade, poderá existir diferenças entre idades cronológicas, fazendo com que uma pessoa seja “mais velha” do que outra. Portanto, podemos considerar que a idade cronológica de um ser humano são o número de dias desde o seu nascimento até ao momento atual. É o tempo que o ser humano tem de vida.

Por sua vez, e de acordo com Barnsley et al. 1992, a idade relativa refere-se à diferença de idades em crianças agrupadas no mesmo escalão etário. Segundo Vaeyens et al. 2005, a abordagem mais comum para o estudo deste fenómeno passa pela estratificação da amostra em trimestres de nascimento, analisando a variabilidade da distribuição do número de sujeitos por trimestre (Malina,2005) em determinados grupos de elite ou, mais recentemente, na influência efetiva da idade na performance desportiva (Costa et al., 2012).

Tendo em conta as definições suprarreferidas, podemos fazer a divisão dos trimestres da seguinte forma:

  • 1º Trimestre – Janeiro a Março;
  • 2º Trimestre – Abril a Junho;
  • 3º Trimestre – Julho a Setembro;
  • 4º Trimestre – Outubro a Dezembro.

Atendendo a esta distribuição, se formos comparar um atleta que nasceu em janeiro e um atleta que nasceu em dezembro, haverá diferenças morfológicas entre os dois?
De acordo com Helsen, Hodges, Van Winckel e Starkes (2000), quando nos referimos ao efeito da idade relativa, devemos sempre atender à existência de eventuais diferenças de experiência em função da idade. Segundo estes autores, dois jovens do mesmo ano de nascimento, podem vivenciar experiências muito diferentes, se um nascer no início do ano e o outro no final do mesmo ano, o que pode significar uma desvantagem para os nascidos no final do ano.

As fases sensíveis para o desenvolvimento das capacidades condicionais e coordenativas

As crianças em fase de desenvolvimento são seres individuais, que requerem uma atenção redobrada e minuciosa para que lhe possam ser transmitidas as bases necessárias a um bom desenvolvimento motor. Nesse sentido, importa perceber que o desenvolvimento motor é:

“a mudança progressiva na capacidade motora de um indivíduo, desencadeada pela interação desse indivíduo com seu ambiente e com a tarefa em que ele esteja engajado. Em outras palavras, as características hereditárias de uma pessoa, combinadas com condições ambientais específicas (como por exemplo oportunidades para prática, encorajamento e instrução) e os próprios requerimentos da tarefa que o indivíduo desempenha, determinam a quantidade e a extensão da aquisição de destrezas motoras e a melhoria da aptidão dessa pessoa.” (Gallahue, D.)

Será, também, nestas idades, que as crianças deverão ser estimuladas para desenvolver as suas capacidades condicionais (força, velocidade, resistência e flexibilidade) ou as capacidades coordenativas (equilíbrio, ritmo, reação, diferenciação cinestésica e orientação espacial). Nesse sentido, importa perceber que existem fases sensíveis para o desenvolvimento dessas mesmas capacidades.

Tal como podemos observar nas figuras 1 e 2, alguns autores defendem que se deve começar a estimular a flexibilidade e as capacidades coordenativas mais cedo, e posteriormente, o desenvolvimento da velocidade, força e resistência.

Figura 1 Fases sensíveis para o desenvolvimento das capacidades condicionais e coordenativas
Figura 2 Fases sensíveis para o desenvolvimento das capacidades condicionais e coordenativas

Relação entre a idade relativa e as fases sensíveis para o desenvolvimento das capacidades motoras

Tendo em conta todos os dados já apresentados, e voltando à pergunta inicial, será que haverá diferenças morfológicas entre um atleta nascido em janeiro e um atleta nascido em dezembro?

Helsen (2005) afirma que, diferenças entre a idade relativa próxima de 12 meses podem resultar em significativas variações antropométricas dentro de um mesmo grupo, diferenças essas com maior significância durante os períodos de rápido desenvolvimento morfológico (pico de crescimento). Até mesmo a diferença da capacidade de desenvolvimento motor de uma criança que nasce no primeiro semestre competitivo de um ano em relação a uma criança que nasce no segundo semestre competitivo do mesmo ano, pode ser um fator de desmotivação para a continuidade numa modalidade desportiva.

Embora pareça haver diferenças na maturação, força e capacidades motoras, também devemos ter em conta as capacidades psicológicas quando nos referimos ao efeito da idade relativa. Segundo Musch e Grondin, 2001, em função da sua idade, os jovens não apresentam diferenças apenas na sua maturidade física, mas também na sua maturidade psicológica.

Portanto, e baseando-se na literatura existente sobre o efeito da idade relativa, podemos afirmar que os atletas nascidos nos 2 primeiros quartis, poderão ter vantagens sobre os atletas nascidos nos 2 últimos quartis. Para reforçar esta ideia, e de acordo com a figura 3, rapidamente conseguimos perceber que 75,95% dos atletas da formação do Sport Lisboa e Benfica, do Futebol Clube do Porto e do Sporting Clube de Portugal nasceram nos 2 primeiros trimestres do ano. Apenas 24,04% dos atletas destes clubes nasceram nos 2 últimos trimestres do ano.

Figura 3

Podemos então concluir que os atletas nascidos nos 2 primeiros trimestres do ano, poderão ter mais vantagens na prática desportiva, em detrimento dos nascidos nos 2 últimos trimestres do ano. Estas vantagens, revelam-se, sobretudo, no que respeita ao desenvolvimento das capacidades físicas e motoras e que permite aos atletas destes quartis evidenciarem um desenvolvimento mais acentuado do que os outros atletas, do mesmo ano de nascimento.
Será então viável manter os mesmos formatos competitivos nos escalões de formação, e continuar a considerar as idades cronológicas em vez das idades relativas ou até outro tipo de variável?

Referências Bibliográficas

Barnsley, R.H; Thompson, A. H., e Legault, P. (1992) Family Planning: Football style. The relative age effect in football. International Review of Sport Sociology, 27, 78 – 87.

Costa, A. M., Louro, H., Ferreira, S., Marques, M. C., Marinho, D. A. (2012). The relative age effect among elite youth competitive swimmers. European Journal of Sports Science (in press).

GALLAHUE,  D.  L.  (1996)   Developmental  physical  education  for  today’s  children. Dubuque, IA: Brown & Benchmark.

Helsen, W. F.; Van Winckel, J e Williams, M.A. (2005). The relative age effect in youth soccer across Europe.

Helsen, W.; Hodges, N.; Van Winckel, J; & Starkes, J. (2000) The roles of talent, physical precocity and practice in the development of soccer expertise

Musch, J. e Grondin, S. (2001). Unequal competition as impediment to personal development: A review of the relative age effect in sport. Developmental review, 21, 147 – 167 (2001) Université Laval, Québec, Canada.

Semião, P. (2012). Efeito da idade relativa na aptidão física em contexto escolar. Relatório de estágio. Universidade da Beira Interior, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas – Departamento de Ciências do Desporto, Covilhã, Portugal

Vaeyens, R. ; Philippaersts, R. e Malina R. (2005). The relative age effect in soccer: a matchrelated perspective.

3 Comentários

  1. William
    28 Julho, 2020
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    Seria interessante referir que percentagem chega a profissional, de acordo com o trimestre de nascimento. Por acaso, a percentagem maior é no último trimestre.

  2. Adair Moreira de Almeida Júnior
    6 Agosto, 2020
    Responder

    Excelente artigo relacionado a maturação.

  3. Alex
    6 Agosto, 2020
    Responder

    Boa noite, você não referencia qual é o autor da Figura 2. É retirada do livro do GALLAHUE, D. L. (1996) – Developmental physical education for today’s children. ???

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